O funk nunca foi marginalizado

Acho curioso quando a classe mais intelectual evoca uma suposta "marginalização" da sociedade ao funk, comparando até mesmo com o tratamento feito ao samba no Brasil pós-escravidão. Ou ainda colocar o funk carioca como algo "disruptivo". Balela. O funk sempre foi aceito pelo mainstream. A real é que o funk é que deixou-se marginalizar.

Qual é o "marco zero" do funk carioca? O disco "Funk Brasil", de 1989, do DJ Marlboro. Existiu uma resistência inicial do mainstream? Existiu. Mas, nos volumes seguintes, já existiam faixas cantadas por Dercy Gonçalves, Luiz Fernando Guimarães & Regina Casé (então astros do "Programa Legal", da Globo) e as Paquitas. E a própria Globo encaixou o "Feira de Acari", do MC Batata, na trilha da novela "Barriga de Aluguel" e "Rap da Rapa", de Ademir Lemos, na trilha de "O Dono do Mundo". Aliás, se você pegar os discos mais antigos da Furacão 2000, você vai ver que eles eram distribuídos pela Som Livre, a gravadora da Globo. Que marginalização é essa?

A verdade é que, ao passar dos anos, ganhou muita popularidade dos festivais das galeras (que "evoluíram" para os bailes de corredor), além do aumento do interesse do tráfico de drogas sobre os bailes. O funk quase acabou no Rio de Janeiro no fim dos anos anos 1990 porque o negócio tinha saído muito do controle (até o Claudinho & Buchecha, sucesso nesse período, meio que fugiam do rótulo de "funkeiros"). Tanto que as equipes de som tiveram que se reinventar para o negócio não acabar de vez. Por causa disso que surge o funk dos anos 2000, com aquelas letras mais sacanas que fez o gênero virar fenômeno nacional. Depois veio a "geração da Anitta", o funk ostentação paulistano... Todos com ampla exposição no mainstream. Por isso que dou risada quando vejo um funkeiro na atualidade dizendo que "está fazendo história" por botar funk na Globo. Tem uns 30 anos que a Globo toca funk, cara!

O problema está mais para como o gênero de expõe na atualidade. Músicas mais explícitas sempre existiram; mas, se você quisesse consumi-las até uns anos atrás, você tinha que ir no camelô e comprar o CD. Hoje, basta abrir o TikTok. Uma Valesca Popozuda não cantava "pega no meu g... e mama" nos programas de auditório da televisão, optando pelas "versões light" de suas músicas. Hoje, os artistas nem se preocupam mais em amenizar as letras quando cantam para um público mais amplo. Não faz muito tempo que a Anitta estava cantando "olha o tamanho dessa p..."para um milhão de pessoas na Praia de Copacabana com transmissão da Globo.

Não sou moralista. Mas sei que tudo tem limite. As críticas relacionadas ao funk sempre foram relacionadas à maneira como o gênero se posiciona. Porque o gênero sempre foi abraçado quando conseguia conversar bem com o grande público.